domingo, 14 de dezembro de 2014

Kalocagatia para Sócrates

Ballerina on a string, Banksy

O conceito de Beleza poder-se-ia, em Sócrates, definir em apenas uma palavra: kalocagatia. Não fosse o grande filósofo um homem, não de grandes palavras escritas mas ditas, não seria preciso dizer (ou escrever) mais nada. Nascido de mãe parteira e pai artista (escultor), é, no mínimo, curioso como conseguiu, com a sua tão irónica (e conhecida) frase «só sei que nada sei», transmitir tantos ensinamentos e dar “à luz” um processo que, através do diálogo, levava o seu interlocutor «a descobrir por si próprio a falsidade do seu ponto de vista e a exactidão do de Sócrates» (Legrand:250). A esta arte foi dado o nome de maiêutica, precisamente em referência ao ofício de sua mãe.

Atenas “gerou”, no ano de 470 a.c., o homem que viria a “revolucionar” (renovar ?) o pensamento filosófico - afinal, “combateu” o sofismo da época  (Cordon e Martinez:59): ao contrário dos sofistas, defendia a «universalidade dos conceitos», porque tinha uma «grande vontade de mudar a sua sociedade» (Gonçalves:80)  – e a influenciar os vindouros.  Como se de uma “restauração” da linguagem dos homens (idem:81) se tratasse, ou seja, de um re-arranjar da forma como estes se organizavam, de acordo com o valor universal da unidade no entendimento em sociedade. Esse valor devia ser comum à comunidade e só assim se podiam entender os conceitos de Belo e Feio.
Porque essa educação dos homens não é feita, absolutamente, de forma linear, não se pode utilizar apenas uma palavra para entender, então, o conceito de Beleza para Sócrates. Se, ainda assim, quisermos defini-la de forma simples, podemos dizer que será uma junção «do belo com o agradável, o bom e o útil» , associada à Moral e à Política.

No entanto foi necessário interrogar-se (a si, como a outros diversos interlocutores), sobre o “traço comum” entre as coisas belas mas tão diferentes, concluindo que a Beleza em si (kalon kath’auto) existe apenas se, com o Bem, estiver relacionada ao kromenon, isto é, ao «conveniente, útil» (Bayer:34). Neste sentido, se uma coisa feia for útil, é, igualmente, bela.
A sua estética é utilitária, cuja Beleza deve atingir a perfeição, a virtuosidade (virtú), através da sabedoria e da harmonia entre os os homens (a unidade, mencionada anteriormente). Embora na natureza não exista nada que não contenha imperfeições, deverão reunir-se as coisas belas que existem dispersas, numa espécie de “movimento” que passa da desordem ou do múltiplo para a ordem ou Uno. Esse “movimento” de procura é a própria aquisição de conhecimento que conduzirá à verdade.

A maiêutica e a kalocagatia são dois pontos essenciais da doutrina socrática. Pelo diálogo Sócrates faz com que o indivíduo se questione e entenda o seu valor interior (a sua alma ou psyché), de forma a que, na sociedade de que faz parte, através do seu conhecimento intelectual e moral (saber), dos seus sentidos, da contemplação, da actividade prática,  da estética e da bondade, se atinja ou se aproxime da verdadeira Beleza.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAYER, Raymond, História da Estética, Editorial Estampa, Lisboa, 1979;
CORDON, Juan Manuel Navarro e MARTINEZ, Tomas Calvo – História da Filosofia, vol.1, Edições 70, Lisboa,1989; 
FERREIRA, João Monge, definição de Kalocagatia, em http://republicacriativa.wordpress.com/rastos/;
GONÇALVES, Carla Alexandra - Estética e Teoria Da Arte – Sobre O Mundo e o Entendimento das Obras de Arte - e-book, Universidade Aberta, 2008;
LEGRAND, Gerard – Dicionário de Filosofia, Edições 70, Lisboa, 1991;



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